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Amatra 19 realiza webinário que discute “jurisdição sobre direitos fundamentais na ótica da interpretação sem fim

A Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 19ª Região (Amatra 19) realizou, nesta quarta-feira (16), o webinário com o título “Jurisdição sobre direitos fundamentais na ótica da interpretação sem fim”. O evento foi transmitido ao vivo simultaneamente pelo Instagram e YouTube. Participaram da exposição o professor-doutor e promotor Augusto César Leite De Resende, a professora-doutora e advogada Helenice Oliveira de Moraes; e o desembargador Pedro Inácio da Silva, do Tribunal Regional do Trabalho da 19ª Região (TRT/AL).

A abertura foi realizada pelo mediador Alan da Silva Esteves, juiz titular da 7ª Vara do Trabalho de Maceió e diretor tesoureiro da Amatra 19, que estabeleceu três premissas sobre o tema do webinário. “Primeira, uma interpretação sem fim não significa uma interpretação sem critério, ela tem um endereço, embora possa mudar. Segunda, o texto jurídico é apenas um recorte da realidade, ou seja, possui inúmeras possibilidades de interpretações quando encontra o mundo dos fatos. Terceira, no estágio atual, os textos interpretam outros textos”. No caso, concluiu o magistrado, na seara jurídica, os direitos fundamentais são textos que interpretam os demais direitos e permite, assim, uma interpretação jurídica continuada. As palestras seguiram esse itinerário.

Augusto César Leite De Resende

O promotor Augusto Cesar iniciou sua exposição ressaltando que a Constituição é classificada como material e informal. “A consequência dessa separação, que foi imposta pela sacralização do Poder Constituinte efetivada pelo Constitucionalismo Liberal do século 19, foi a negação da existência de outras fontes de Direito Constitucional para além do Poder Constituinte”.

Logo em seguida, citou que o princípio constitucional fraternidade está implícito e impõe o dever de reconhecer indivíduos excluídos, que hoje estão numa relação de sujeição, ou seja, a fraternidade compreende positivamente concorrer positivamente para o progresso material e espiritual daqueles que integram grupos minoritários, de preferência.

Augusto Cesar deu exemplo da aplicação concreta do princípio da fraternidade, que toca o consumo consciente. “A humanidade vivencia na atualidade uma verdadeira crise ecológica, provocada pela produção e o consumo humano. O consumo afeta o meio ambiente, porque a natureza que fornece as matérias-primas para a produção de bens e serviços que são colocados no mercado de consumo. Isso impacta negativamente nos direitos humanos”, explica.

O promotor também afirmou que o princípio da fraternidade se apresenta como um princípio ativo motor do comportamento da ação dos seres humanos, que impõem deveres para com a comunidade e para com o outro. “O princípio jurídico da fraternidade responsabilizada cada indivíduo pelo demais e, consequentemente, pelo bem da comunidade”, explicou.

Na sua fala, o jurista alertou do consumo da humanidade no planeta, que utiliza mais do que a capacidade de renovação. “Se o padrão de consumo de mantiver no atual patamar, em menos de 50 anos, serão necessários dois planetas terra para atender a população”, sentenciou.

Ele disse que o ato de consumidor traz danos para os direitos humanos e a natureza, assim, há uma necessidade de as pessoas adotarem a prática de consumo consciente. “Existem três variações de consumo: consumo alienado, no qual o consumidor não se preocupa com a qualidade e procedência dos produtos; consumo crítico, em que as pessoas procuram qualidade e evitam desperdício e excesso; e o consumo consciente, que é o mais importante de todos, em que o consumidor antes de comprar, indaga de onde vem o produto, quem produziu e suas condições”, explicou.

Para finalizar sua participação, Augusto destacou que o exercício da atividade jurisdicional, ou seja, a luz do princípio da fraternidade, tem o potencial de transformar a sociedade, tornando-a mais justa e menos preconceituosa, surgindo consequentemente, uma prática fraterna judicial no mundo.

Helenice Oliveira de Moraes

Com tema “Medida protetiva da mulher no trabalho em situação de vulnerabilidade”, a advogada Helenice Oliveira de Moraes fez uma perspectiva histórica sobre os direitos humanos das mulheres, como a busca por reconhecimento de direitos, busca de direitos de subjetividade e na perspectiva internacional.

Ela citou que devemos enxergar a lei Maria da Penha não somente pelo aspecto criminal. “Escuto muitas vezes que a Lei Maria da Penha se atém ao aspecto criminal e fica totalmente restrita a penalização do agressor. No entanto, a Lei Maria da Penha não é somente nesse aspecto”, ressaltou. E pontuou que, no primeiro momento, a lei protege a família e a mulher e que a violência doméstica também trata da violência física, moral, patrimonial, psicológica e tantas outras formas, muitas vezes desconhecidas. Arrematou que é preciso uma rede de proteção e que os poderes públicos devem trabalhar em harmonia e complementaridade para resolver o problema.

Ressaltando a importância do senso crítico da mulher em relação aos seus direitos, Helenice explicou o propósito da medida protetiva, que é evitar que a violência se torne real ou que não se repita. “As medidas protetivas existem, mas para que elas funcionem, é necessário que tenhamos uma rede de apoio. É necessário que seja uma pauta permanente”.

Para finalizar, a jurista destacou que, para a violência doméstica se tornar um dado histórico, é necessário que a sociedade participe da discussão, da necessidade que a Lei exista, mas que exista de forma suficiente. “Devemos reconhecer a necessidade do outro de forma efetiva e, a partir daí, pensarmos num sistema de justiça integrado, e assim possamos assegurar que realmente as mulheres estão protegidas”.

Pedro Inácio da Silva

Abordando o tema “Visão equivocada das críticas aos tribunais nos julgamentos sobre os direitos fundamentais”, o desembargador Pedro Inácio da Silva, iniciou sua participação indagando se os tribunais estão acima das críticas? Quais são as críticas às decisões do STF em matéria de direitos fundamentais? Quem são os críticos e se há uma distinção entre críticas as decisões judiciais e críticas que atentam contra o Estado Democrático de Direito?

Na sua fala, o jurista recordou que a jurisdição constitucional surgiu ao final da Segunda Guerra, na emergência do Estado Democrático de Direito, orientada pela defesa dos direitos fundamentais e dos direitos humanos, exibindo um vasto catálogo de direitos básicos. “Os novos desafios da jurisdição constitucional de grau de dificuldade elevado invadiram espaços que antes eram ocupados unicamente pelo legislativo. As cortes passaram a receber críticas avassaladoras, chamada de governos de togas”.

O desembargador destacou que os juízes carregam, para os processos que vão julgar, grande parcela da humanidade com as virtudes ou fraquezas e que há uma grande incompreensão quando se formula as críticas. “Diferente das leis, que possuem conteúdos formatados nas normas constitucionais, a jurisdição possui um conteúdo aberto, que necessita de interpretação constitucional”, explica.

Encerrando sua participação, Pedro Inácio afirmou que a contraposição de ideias é própria das ciências e, notoriamente, do Direito. “Mas, nesse espaço dialético, seria desejável para seu aprimoramento que nós, operadores do Direito, nas nossas intervenções críticas aos Tribunais, Supremo e juízes, se pautassem em argumentos fundamentados, sem banalizações que muitas vezes atraem holofotes, mas, elas, se vazias em si e ofensivas ao Estado Democrático de Direito, não constroem nada”, finalizou.